Pesquisadores brasileiros desenvolvem aplicativo que identifica violência contra a mulher pela voz
MujeresNa infância, Lincon Ademir vivenciou de perto cenas de de violência contra a mulher. As agressões sofridas por sua mãe faziam parte do seu cotidiano e, na época, ele não podia protegê-la. Já adulto e agora gerente de desenvolvimento de softwares, ele decidiu que precisava fazer algo para ajudar outras mulheres. Em 2018, idealizou um aplicativo para celular que usa inteligência artificial para identificar pela voz que uma mulher está precisando de socorro. A primeira versão do app será lançada no mês que vem.
— Eu cresci vendo minha mãe passar por isso. Vi essa violência enquanto era novo. E estava vendo uma matéria na TV, em que uma mulher gritou por socorro por quatro horas e ninguém a ajudou. As pessoas se silenciam, não se mexem, não ajudam. Pensei em como criar uma ferramenta para que o socorro fosse acionado de forma automática — conta.
O projeto faz parte do mestrado profissional de Ademir no Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (Cesar) e é coordenado pela orientadora Ana Paula Furtado, professora de pós-graduação da Cesar School (Escola de Inovação da Cesar) e da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), que lidera uma equipe de 28 pessoas envolvidas no desenvolvimento do app.
— A tecnologia já serve pra tanta coisa. As pessoas ganham milhões com diversas soluções. Pensamos em usar a tecnologia para atender esse problema social, para evitar que as mulheres morram — afirma Furtado, que é doutora em ciência da computação.
Como funciona
Uma vez instalado no celular, o app, chamado Hear — uma sigla para «Helping Everyone to Actively React» (ajudando todos a reagir ativamente, em tradução livre) — capta os sons do ambiente, mesmo offline, e usa inteligência artificial para identificar os sentimentos na voz da usuária ou palavras-chave que indiquem uma agressão.
Se for constatada uma situação de violência ou risco, imediatamente é acionada uma rede de mulheres cadastradas na plataforma, conforme a proximidade ao local da ocorrência, para que possam prestar ajuda à vítima e chamar as autoridades.
— A vantagem do app é que a mulher não precisa apertar um botão de socorro. Ela não precisa estar com o celular na mão. O celular vai fazer uma análise de sentimento a partir da voz e acionar a ajuda — diz Ademir.
Não há notificação automática à polícia. Apenas as pessoas cadastradas no app são avisadas da situação e podem decidir como ajudar a vítima, afirma Furtado. A ideia é de que, no futuro, o aplicativo seja nativo no sistema operacional do celular. Ou seja, não dependa da instalação e cadastro para funcionar.
— Em fevereiro vamos lançar a primeira versão, mas como todo aplicativo que envolve inteligência artificial, ele precisa de uma base de dados para ficar cada vez mais preciso — explica a doutora em ciência da computação.
O Globo