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Após vitória presidencial comovente, Pedro Castillo vive meses de tormenta no Peru

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Especialista vê cometimento de ‘erros primários’; deputada do Perú Libre critica distanciamento com pautas da esquerda

Muitos candidatos no primeiro turno e uma dura disputa entre a esquerda e a extrema-direita no segundo. Feita uma série de ressalvas, é possível dizer que o Peru assistiu no ano passado a um enredo que pode se repetir na eleição de 2022 no Brasil. Boa parcela da esquerda latino-americana celebrou a vitória de Pedro Castillo contra Keiko Fujimori, a postulante do neoliberalismo autoritário.

De fato, havia motivo para comemorar: ex-professor de formação marxista, Castillo é um outsider, representante do altiplano muitas vezes ignorado pela elite limenha. Era indicado pelo partido de esquerda mais radical da disputa e aparecia com baixos percentuais de voto nas pesquisas eleitorais.

Depois de uma turbulenta crise marcada pela nomeação de quatro presidentes em apenas quatro anos, o país via pela primeira vez um camponês a chegar ao poder. Seis meses desde a posse, porém, o Peru nos lembra que a glória nas urnas não garante um mandato tranquilo.

O pouco tempo foi o bastante para que Castillo se tornasse alvo de um processo de impeachment, protagonizasse escândalos de corrupção, visse os seus índices de reprovação aumentarem e ficasse isolado no Congresso a ponto de romper com o próprio partido, o Peru Libre. Integrantes da sigla o veem próximo da direita e evitando se engajar em pautas à esquerda.

Em encontro com religiosos na quarta-feira 12, Castillo admitiu que está passando dificuldades e disse ter chegado à conclusão de que virar presidente é fácil, mas “governar é diferente”.

“Temos aprendido coisas que nem sequer passavam pelas nossas cabeças”, declarou.

O presidente peruano não teve descanso nem mesmo no início do ano novo. Nos últimos dias, ele recebeu o status de investigado pela Procuradoria-Geral da República, e uma diligência do Ministério Público manteve o chefe do Executivo no centro de um escândalo.

Um dos principais fatos do noticiário político peruano trata da Casa de Breña, imóvel em um dos distritos de Lima onde Castillo teria feito despachos e realizado reuniões secretas com políticos e empresários. A histeria começou em novembro, a partir de quando o programa Cuarto Poder, da emissora de televisão América Notícias, divulgou reportagens com registros de visitas do mandatário ao local.

Um dos vídeos exibidos pela TV mostra Castillo saindo de um Audi branco, de propriedade da Presidência, e entrando na casa, no dia 7 de novembro, às 21h50. Detalhe: em vez de estar com o seu usual chapéu de abas enormes, o presidente usava um boné. Minutos depois, o sobrinho do presidente e uma “mulher misteriosa” chegam em outro automóvel e também entram na casa. Quando dá quase meia-noite, os veículos os levam embora. Registros de outros dias dão conta de visitas de demais funcionários do governo e pessoas não identificadas.

Segundo o dono do imóvel, Alejandro Sánchez, Castillo visitava a casa de 15 em 15 dias. Sánchez é um empresário de 37 anos, dono da companhia Aldalab, que trabalha desde 2011 com vendas de equipamentos médicos.

A descoberta das visitas de Castillo desestabilizam a credibilidade do governo porque, primeiramente, incita discursos sobre falta de transparência. E alguns casos servem para alimentar a suspeita de que a casa servia como um canal para operações irregulares, como o favorecimento ilícito de empresários.

É o que se diz, por exemplo, sobre a empresária Karelim López, que, por meio de encontros na Casa de Breña, teria agido para que um consórcio de empresas – chamado Consorcio Puente Tarata III, integrado pelas empresas Tableros y Puentes, H. B. Estructuras Metálicas e Termirex – ganhasse a licitação de obras de um projeto de infraestrutura do Ministério de Transportes e Comunicações, o Provias Descentralizado.

Castillo nega ter se reunido com Karelim López e diz que apenas realizava encontros de caráter pessoal. Já o ex-secretário da Presidência Bruno Pacheco disse nesta semana que a empresária havia visitado o Palácio do Governo algumas vezes para tratar de projetos sociais.

Assim como López, Pacheco também é investigado e virou um dos principais personagens do escândalo depois de ter sido flagrado com 20 mil dólares dentro do prédio presidencial – segundo ele, o dinheiro não vem de corrupção, mas de doações familiares.

Ao escândalo da Casa de Breña, está somado outro relacionado a ascensão ilegal de militares das Forças Armadas. O Ministério Público abriu uma investigação em 11 de novembro contra Pacheco e o ministro da Defesa, Walter Ayala Gonzales, por conta de supostas pressões exercidas para que militares próximos do governo fossem promovidos.

O presidente peruano chegou a demitir os três chefes das Forças Armadas, e o comandante do Exército, José Vizcarra, disse à imprensa que Castillo queria a promoção de dois coronéis.

Em 28 de dezembro, o presidente foi interrogado sobre as acusações de interferência e as rechaçou. Disse que, voluntariamente, solicitou a quebra do próprio sigilo bancário, tributário e de comunicações. As investigações continuam. No sábado 15, o governo publicou um decreto que estabelece normas para o plano de carreira dos oficiais.

Para Raul Nunes, sociólogo e membro do Núcleo de Estudos de Teoria Social e América Latina, a participação de Castillo nas reuniões da Casa de Breña e as pressões para a promoção de militares demonstraram mais ignorância sobre o funcionamento do Estado do que interesse em corrupção.

A sequência desses atos dá munição para que a oposição no Congresso, liderada pelos partidos Fuerza Popular, Renovación Popular e Avanza País, persista nas tentativas de demovê-lo. O status de investigado pela Procuradoria é um peso especial contra o presidente.

“São sucessivos erros muito primários, logo no começo do mandato”, comenta o analista, ouvido por CartaCapital.

Nunes observa que todos esses erros e a mobilização do Ministério Público já têm enfraquecido o governo, a ponto de o Congresso se fortalecer para derrubar ministros com moções de censura, instrumentos do Parlamento com poder de destituição.

Depois de algumas tentativas, a primeira moção de censura foi aprovada em 21 de dezembro e resultou na queda do ministro da Educação, Carlos Gallardo.

E Gallardo não foi o primeiro a ser substituído por pressão da oposição. Castillo já teve que trocar o seu líder ministerial, Guido Bellido, representante do próprio partido, depois que ele defendeu a legitimidade do governo da Venezuela e anunciou que forçaria a renegociação de contratos de uma jazida de gás em Cuzco. Declarações machistas contra uma líder opositora também contaram. Junto com Bellido se foram outros seis ministros.

Castillo também tem tido dificuldades para nomear o novo presidente da empresa estatal Perupetro. O seu indicado, Daniel Salaverry, um político de carreira, só poderá ocupar o cargo após pronunciamento da Controladoria.

“As investigações em curso vão debilitando a própria configuração dos ministérios, das empresas e da agenda”, considera Nunes. “Talvez não consigam derrubar o presidente agora, mas vão minando o governo.”

Silvana Robles, deputada de 37 anos que atua como uma das porta-vozes da bancada do partido Perú Libre, critica o uso sistemático de moções de censura no Congresso, por representarem tentativas de colocar “ministros contra a parede”. Para Robles, a oposição parlamentar são uma “pedra no sapato” de Castillo, e as investigações judiciais são o seu “calcanhar de Aquiles”.

Em entrevista a CartaCapital, porém, a congressista também critica o presidente, ainda que ambos sejam do mesmo partido. Na visão dela, o ex-líder sindical tem estado cada vez mais longe dos eixos programáticos da legenda, que se denomina como marxista-leninista.

Entre as principais queixas, estão a falta de comprometimento com a reforma da Constituição, que, segundo ela, tem artigos que beneficiam a iniciativa privada de modo injusto na organização de setores econômicos estratégicos, e a recondução do presidente do Banco Central, Julio Velarde, ao cargo no qual se mantém desde 2006.

Os acenos ao mercado já foram chamados de “giro à direita” pelo Perú Libre. Foi um dos sinais mais claros de que a relação entre o presidente e a sigla não estava nada boa. À reportagem, Robles confirma o diagnóstico.

“Considero que o distanciamento foi bastante notório do presidente com a bancada oficialista e com o partido Perú Libre”, descreve ela.

Segundo Robles, houve uma rápida reaproximação entre Castillo e o partido, quando ele procurou a bancada para buscar apoio contra o pedido de impeachment. Ela conta que a militância da legenda em Junín, onde ela foi eleita, chegou a apoiar a aprovação da moção de vacância (instrumento similar ao impedimento), mas os parlamentares decidiram reconhecer a legitimidade do mandato presidencial.

Ainda assim, ela diz que não vê abertura da Presidência como crê que deveria ser.

“Como parlamentar oficialista, não tenho as portas abertas do Executivo. Muito pelo contrário. Vejo certo fechamento de portas para nós”, declarou. “Supõe-se que deveríamos ter as portas abertas do Executivo, mas atualmente não as temos. É uma grande trava para a gestão parlamentar. Às vezes queremos ajudar, mas não nos deixam ajudar.”

Castillo, que não foi um militante histórico do partido, nunca fez grandes promessas de que seguiria os eixos programáticos da sua agremiação. Filiou-se à legenda em 2020, para disputar a Presidência, e registrou o programa partidário na Justiça Eleitoral, mas sem divulgar um plano de governo objetivo. Ao tomar posse, tinha apenas uma lista de desejos para os primeiros cem dias, mas sem metas claras e muito menos de longo prazo.

Sem dar entrevistas à imprensa, Castillo dá pistas nebulosas sobre o que pretende fazer no mandato. As ameaças das investigações e o apoio escasso no Congresso – hoje ele só pode contar de verdade com os cinco deputados da aliança esquerdista de Verónika Mendoza, ex-adversária na eleição passada – fazem com que, na visão de Robles, ele busque proximidade cada vez maior com os setores à direita e corra o risco de escolher pela “traição ao povo”.

“Por experiência vivida no Peru, a direita não descansa até golpear. São seus amigos em alguns feitos, mas quando têm que golpear diante de qualquer erro, atuam como os principais promotores”, considera a parlamentar. “Creio que o presidente tem a responsabilidade de corrigir erros em sua conduta. Não tenho razões para duvidar de sua honestidade, mas ele tem o dever de fechar as portas à dúvida, à suspeita.”

Questionada se ainda tem expectativas de que Castillo volte a ser mais próximo ao Perú Libre, ela finaliza: “Não perco as esperanças. Há um povo que espera pela mudança.”

CARTA CAPITAL

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