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Doutor da Fiocruz contradiz colunista de jornal nacional por texto «sem fundamento» sobre Mais Médicos

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Foto: Araquém Alcântara
Foto: Araquém Alcântara

Na última quarta-feira (14), o governo de Cuba anunciou o rompimento de contrato com o programa Mais Médicos no Brasil devido às declarações do presidente eleito Jair Bolsonaro, que questionou a preparação dos especialistas cubanos e impôs condições para a permanência deles no projeto. Com as exigências, o país caribenho decidiu solicitar o retorno dos cerca de 8,5 mil profissionais que atendem brasileiros em 3.243 municípios pelo programa.

Em resposta a um dos principais colunistas do jornal O Globo, Merval Pereira, que divulgou em sua coluna do último sábado (17) o texto «Uma crise política», em que critica a forma de atuação do Mais Médicos, o doutor da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Eduardo Vieira Martins, esclareceu as informações «inverídicas» e «sem fundamento», segundo ele, divulgadas pelo jornalista.

Há 45 anos atuando em saúde pública, Martins sugere na carta endereçada a Merval que procure a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), gestora do convênio Brasil-Cuba, para esclarecer que esta não aceitaria colocar médicos «em trabalho escravo» ou sem formação adequada em seus programas. Segundo o doutor, os médicos formados em Cuba são treinados para a atenção médica integral, ou seja, exercem o atendimento de clínico geral com prevenção e intervenção, além de, caso necessário, encaminharem os pacientes para cada especialidade.

Martins afirma que, quando comparados os índices de saúde, preconizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), os números de Cuba estão semelhantes aos da Europa e de outros países desenvolvidos. «No Brasil os resultados são absolutamente lamentáveis pois não prevenimos nem promovemos a saúde. Esperamos as pessoas adoecerem e entrarem nas filas de atendimento, onde por vezes morrem», aponta e sugere que sejam verificados os indicadores de saúde dos municípios onde os médicos cubanos atuaram para se constatar a melhoria significativa dos mesmos.

Leia abaixo a íntegra da carta do médico da Fiocruz, Eduardo Vieira Martins, ao colunista d’O Globo Merval Pereira:

 

Merval,

 

Trabalho há 45 anos na área de saúde pública tendo trabalhado na Secretaria de Saúde de Minas Gerais e na Fundação Oswaldo Cruz.

Posso lhe afirmar que conheço bem os sistemas de saúde em praticamente todos os estados no Brasil em centenas de municípios da Amazônia ao Rio Grande do Sul.

Em sua coluna «uma crise política» você foi extremamente infeliz pois citou dados e informações que são totalmente inverídicas que passo a citar agora.

Atualmente em cerca de 2.800 municípios não existem médicos porque os que se formam no Brasil se recusam a trabalhar em localidades pequenas onde não existe a possibilidade de terem clínicas privadas. Na região Amazônica e no Nordeste chegaram a receber salário dobrado e casa para morar e ali não se fixaram.

Os médicos formados em Cuba são treinados para a atenção médica integral no modelo de saúde da família em que o profissional, clinico geral, exerce sua atividade obedecendo à lógica de saúde integral de prevenção, promoção e intervenção. Nos Estados Unidos existe o «family doctor» que trabalha nessa lógica e é o médico que quando necessário encaminha seus pacientes aos especialistas. Esse é o modelo preconizado no SUS, que não se aplica bem no Brasil uma vez que aqui os médicos são formados na lógica da especialidade e da intervenção e nunca da promoção e da prevenção.

Se você comparar os índices de saúde, preconizados pela Organização Mundial da Saúde, pode verificar que os números de Cuba estão nos níveis da Europa e de outros países avançados e no Brasil os resultados são absolutamente lamentáveis pois não prevenimos nem promovemos a saúde. Esperamos as pessoas adoecerem e entrarem nas filas de atendimento, onde por vezes morrem, o que infelizmente assistimos diariamente nos telejornais do Brasil.

Se você tiver a curiosidade de verificar os indicadores de saúde dos municípios onde esse médicos vem trabalhando poderá constatar a melhoria significativa nos níveis de saúde daquelas populações.

Se você não sabe, a Organização Pan Americana de Saúde que é a gestora do convênio Brasil Cuba é uma instituição extremamente séria e jamais aceitaria colocar médicos «em trabalho escravo» ou médicos sem formação adequada em um de seus programas. Seria bom que você procurasse essa instituição antes de afirmar, aos seus leitores mais esclarecidos as mentiras do seu texto.

Lamento que você, um membro da ABL, que para mim tinha alguma credibilidade, se preste a escrever um texto totalmente sem fundamento, com conclusões erradas. Sugiro que em suas próximas colunas, sobre temas que você não tem o conhecimento básico, procure se informar melhor e escute especialistas da área e não, como neste caso um ortopedista e médico do esporte, de um hospital de emergência da Zona Sul do Rio de Janeiro.

 

* Eduardo Vieira Martins -DSC FIOCRUZ tem graduação em Farmácia e Bioquímica pela Universidade Federal de Minas Gerais (1973), especialização em Saúde Pública (ENSP) e Tecnologia Farmacêutica (U.Gent, Bélgica) mestrado e doutorado em Ciência da Informação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atualmente é tecnologista III da Fundação Oswaldo Cruz. Possui experiência nas áreas de Saúde Coletiva, produção e inovação em medicamentos e vacinas.

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